ENTREVISTA COM CRSTINA BRAGA, HARPISTA:“UMA REGIÃO DE MÚSICA E MAGIA”

A artista nasceu e foi criada no Vale do Café

Harpista pioneira, Cristina Braga pôs o instrumento em outro patamar no Brasil,  transitando livremente pela música popular e pela clássica. Precursora no processo de retomada da região, onde sua família tem propriedades há mais de um século, ela foi responsável pela criação, em 2003, do Festival Musical do Vale do Café, realizado até hoje, e é diretora artística do Uaná Etê (que significa multidão de vagalumes), um verdadeiro paraíso ecológico e cultural de inspiração nativa com instalações artísticas dedicadas à música e à natureza.

Rio Já: Como começou sua relação com o Vale do Café?

Cristina Braga:  Sou apaixonada pelo Vale do Café desde que nasci, porque ia para lá de férias, e tinha uma babá que me contava todas aquelas histórias do folclore nacional, como a Mula Sem Cabeça, Saci-Pererê ou Boitatá. No fim dos anos 1990, surgiu a notícia de que seria instalado um presídio de segurança máxima na região e um grupo de amigos conseguiu, graças a um abaixo-assinado e grande mobilização, evitar a construção. Mas ali eu pensei: “aqui é uma região tão rica culturalmente que a gente precisa falar disso”. Comecei a pesquisar em 2001, e como eu já participava de vários festivais musicais aqui e no exterior e via como eles funcionavam como aceleradores das economias locais, resolvi lançar o festival em 2003 e é uma grande alegria ver que ele está vivo até hoje.

Rio Já: Qual é exatamente essa riqueza cultura l da região?

Cristina Braga:  As raízes da música brasileira vêm dali. A Clementina de Jesus e a família do Paulinho da Viola vêm de Valença. Herivelto Martins vem de Paulo de Frontin. Quando você canta o Hino Nacional, você está cantando também o Vale, isto porque quando o poeta Osório Duque Estrada escreve “Do que a terra, mais garrida/Teus risonhos lindos campos têm mais flores/Nossos bosques, têm mais vida/Nossa vida no teu seio mais amores”, ele, que nasceu em Paty do Alferes, está descrevendo o Vale do Café.

Rio Já: É uma influência então basicamente musical?

Cristina Braga:  Não, é brasilidade na veia. Você tem ali, a duas horas do Rio, rezadeiras, raizeiras, Folia de Reis, Calangueiros, desafios de rimas, Jongo, Caninha Verde. Então é muito legal quando você começa a puxar os fios e vê quanta coisa vem dali. Se você entrar na Confeitaria Colombo, e olhar aqueles espelhos enormes, vai ver que são todos decorados com folhas de café. Você encontra esses mesmos elementos nas escadarias do Palácio Tiradentes ou nos balcões do Theatro Municipal, por exemplo.

Rio Já: Moradores mais antigos falam de uma certa magia no ar existente nas matas da região. De onde vem essa história?

 Cristina Braga:  Houve um festival onde organizamos várias palestras e uma delas era de um mateiro de 85 anos. Ele começou dizendo que a mata é ao mesmo tempo um lugar maravilhoso, mas também muito misterioso e perigoso. Você tem de entrar com cuidado e pedir permissão, porque tem um cipó mágico que se você passar debaixo dele vai parar em outro lugar. Eu levei as mãos à cabeça pensando: “caramba, eu não chequei se ele tinha condições de dar essa palestra”. Mas a conversa foi ótima, ele apresentou dados, mostrou ervas sensacionais. Quando acabou, eu perguntei a ele que história era aquela do cipó. Mas havia uma paisagista presente que pediu a palavra e explicou que esse tal cipó era de fato relatado. Pelo que consta, ele exala alguma coisa alucinógena que quando você passa.

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