O NOME DELE É HENRIQUETA

Por Jan Theophilo

Era um domingo, pouco antes do meio-dia, e um solzinho mixuruca aquecia o friozinho modorrento do outono carioca quando a intrépida equipe de Rio Já, em mais um esforço de reportagem, cumpriu a missão de testar o bolso do patrão e um dos restaurantes mais comentados recentemente entre os foodies da cidade: o Henriqueta, mais novo empreendimento do chef Alexandre Henriques, responsável por decolar o Gruta de Santo Antônio, casa portuguesa com certeza que fez história na Ponta da Areia, em Niterói.

A casa já estava lotada as 12h em ponto, mas demos sorte e fomos o terceiro nome da lista de espera. Meia hora depois, o que se via era o de melhor e mais bonito panorama humano que o Leblon poderia oferecer se espalhando pela Aristides Espínola aguardando lugar. Não demorou mais de 15 minutos para conseguirmos uma mesa na área externa do restaurante. O Henriqueta tem um ambiente informal, decorado em tons laranja, garçonetes com uniformes verde e garçons, de rosa, com chapéu panamá.

“Hoje está uma loucura”, já antecipou sorrindo o chef Alexandre Henrique ao cruzar por nossa mesa. Por sugestão dele, abrimos os trabalhos com os “Acepipes da Henriqueta” (a partir de R$ 76), um mix de entradas com tremoços, queijo de cabra frescal, pão, torradas e chouriço fatiado. O preço varia um pouco se você quiser acrescentar mais um embutido como morcela, salpicão, alheira, farinheira ou um queijo Serra da Estrela pelo qual vale a pena viver.

Na sequência, aí já em uma dica do simpático garçom Daniel, pedimos um camarão ao molho Bulhões Pato (R$ 69). Para quem não conhece, é um molho clássico da região da Estremadura, supostamente uma homenagem ao poeta português Raimundo Antonio de Bulhões Pato, que teria mencionado um cozinheiro em seus escritos. Ele leva azeite, manteiga, coentro, vinho branco, limão e lascas finíssimas de alho que parecem cortadas na gillette. Vale a pena pedir um pãozinho extra pra raspar o fim do molho do prato. Ao contrário do que muita gente pensa, não é falta de educação e você ainda faz um chef feliz.

Não se pode ir a uma casa do Alexandre sem provar o bolinho de bacalhau, que na Gruta ele elevou ao estado da arte. No Henriqueta, continua saborosíssimo. Mas jornalistas ranzinzas e mal-humorados, em uma mesa ao lado, vieram com uma conversa de que acharam o tamanho do bolinho do Leblon menor do que o de Niterói.  Como dizia velha piada, tamanho não importa, mas o prazer que se proporciona.

Harmonizar essa brincadeira toda não foi tarefa fácil. Mas foi mesmo por má sorte nossa. O restaurante tem uma carta de vinhos naturalmente forte em vinhos portugueses, mas no dia de nossa experiência, as opções mais em conta já estavam todas esgotadas, e os preços “razoáveis” que restaram começavam na casa dos R$ 160 a garrafa. Taças a partir dos R$ 35.  Impôs-se, então, o sacrificio de pedir um Chateau la Commanderie de Gambou – na verdade, dois, um depois do outro, claro.

A proposta do Henriqueta é apostar basicamente em entradas, petiscos e embutidos. Criando, assim, um ambiente informal que a jovialidade e o bom astral da equipe de atendimento só reforça. Pratos principais são apenas quatro:  polvo à lagareira (R$ 129), arroz de pato (R$ 128) ou de camarão (R$ 118) e, naturalmente, o carro-chefe da casa: o Bacalhau da Henriqueta (R$ 149) – singela homenagem do filho à mãe, Dona Henriqueta Henriques, 83 anos, fundadora do Gruta na década de 1970.

É uma senhora posta de bacalhau dessalgado e confitado, ou seja, o chef precisa ferver o azeite até o máximo 100 graus e tascar a lasca lá dentro. O segredo é saber a hora de tirá-la cozida por dentro no ponto certo, mas com aquela casquinha que dá um sabor todo especial. Ele vem acompanhado de batatas ao murro, geleia de pimentão, farofa de panko e cebola. “É tudo sobre uma homenagem à minha mãe, que me ensinou a cozinhar. Comecei no restaurante dos meus pais aos 15 anos, e chegar no Rio, e no Leblon, aos 50, é um grande sonho, reflexo de uma maturidade pessoal e profissional”, diz Alexandre, que sempre que pode, faz questão de levar ele mesmo os pratos às mesas.

Infelizmente, depois dessa comilança toda, não tivemos preparo físico para ir até as ultra doces sobremesas portuguesas. Bastou o aroma dos pastéis de nata e toucinhos que pareciam mesmo ter vindo do céu.  No fim, a brincadeira toda ficou em R$ 740 para duas pessoas, com duas garrafas de vinho. Para alguns pode ser caro. Mas cerca de 150 dólares por dois é mais ou menos o que você pagaria em qualquer bom restaurante do planeta. Sucesso a essa nova tasca luso-carioca!