DUDA MAGALHÃES: O HOMEM QUE TRAZ DINHEIRO AO CARNAVAL

Duda: "a maratona representa um impacto de quase R$ 300 milhões na economia carioca."

Jan Theophilo 

Ele já foi sócio de Roberto Medina, o criador do Rock in Rio. Foi responsável por trazer o show de Lenny Kravitz, na praia de Copacabana, em 2005, nas comemorações dos 440 anos da cidade, além de organizar eventos como o Rally dos Sertões ou a Maratona do Rio. Desde 2010, Duda Magalhães, presidente da Dream Factory, é responsável por levantar patrocinadores privados que potencializaram os desfiles dos blocos do Rio, o que o credenciou posteriormente a levar a experiência para São Paulo e Salvador. Em 2023, Duda e sua empresa foram contratados pela Liesa para cuidar da reestruturação publicitária do Carnaval carioca, que teve multiplicados os valores de empresas privadas investidos na folia. O empresário defende que os grandes eventos são fundamentais para a economia do país e afirma que o entretenimento é o novo turismo, gerando receita e emprego por onde passa. “Hoje, as marcas entenderam que, no ao vivo, o público está ali por escolha própria, completamente imerso na experiência. Isso mudou a forma como elas enxergam esse ambiente. No ao vivo, a marca não é uma interrupção indesejada, como um anúncio que surge no meio de um vídeo, mas sim uma aliada que agrega valor à jornada do público. Basta olhar para eventos como o Rock in Rio, onde as ativações e atrações paralelas não apenas enriquecem a experiência, mas fazem o festival ser ainda melhor”, diz Duda, que entre inúmeras reuniões pré-carnavalescas recebeu a equipe de ‘Rio Já’ para uma conversa.

Rio Já:  Como a Dream Factory entrou no mercado do Carnaval?

Duda Magalhães: É uma história de muito orgulho, porque nossa empresa é multitemática, a gente não vive só de Carnaval. Mas é dessa forma que a gente vem construindo nossa plataforma de entretenimento ao vivo. A gente tem um grande mosaico, onde cada peça representa um aspecto da cultura brasileira. Tem uma peça de cultura popular que é o Carnaval, e dentro desse território, a gente está tanto no Carnaval de rua como na avenida. Outra que é o Rally dos Sertões, outra que é o Art Rio, uma das feiras de arte mais importantes do país e, entre outras, uma que me traz muita satisfação que é a Maratona do Rio, a maior prova de corrida de rua da América Latina. Segundo dados da Fecomércio, a maratona representa um impacto de quase R$ 300 milhões na economia carioca.

Como começou o envolvimento de vocês com o Carnaval?

Primeiro a gente precisa fazer um recorte. A explosão dos blocos de rua do Carnaval carioca aconteceu ali pelo final do governo Cesar Maia. Em 2009, quando o Eduardo Paes assumiu, não dava tempo para fazer nada, mas ele chamou o então secretário de Turismo, Antônio Figueira de Melo, e determinou: “pro ano que vem, organiza”. E assim a gente entrou nesse, digamos, desafio. Acho que o bloco de rua é essencialmente uma manifestação cultural, democrática e espontânea. E justamente por ter essas características, cabe ao poder público dar a organização e o suporte para que essa manifestação democrática aconteça da melhor maneira.

Qual foi o pulo do gato?

Já existia na própria Prefeitura: era o caderno de encargos, usado na organização do Revéillon de Copacabana, uma das maiores festas do país. E o que é isso? Enquanto organizadora, a Riotur precisa de uma série de insumos de produção de eventos: banheiros, ambulâncias, postos médicos, credenciar ambulantes, fechar trânsito. Ela então publica no Diário Oficial esse caderno e convida produtoras no mercado para ver qual delas tem interesse em fornecer aquilo de forma não onerosa para a prefeitura. Ou seja, em vez de a Prefeitura usar recursos do tesouro para bancar a festa, esse escopo pode ser patrocinado pela iniciativa privada. Então por meio de uma produtora, são fornecidos todos aqueles itens e em troca disso, os patrocinadores podem explorar a visibilidade da cidade em uma troca que me parece lógica. Deixa o dinheiro do tesouro para hospitais, escolas etc. Esse modelo passou então a ser replicado no Carnaval.

E a execução no começo foi fácil?

A parte, digamos, mais difícil é que para apresentar uma proposta você precisa de uma carta-garantia de um patrocinador. O que é óbvio, senão qualquer um chega lá, diz que vai entregar, mas chega na hora não consegue recursos e aí deixa a prefeitura descoberta em cima da hora. Nós conseguimos fechar uma parceria com a Ambev e assim começou o modelo de Carnaval de rua que temos hoje. Onde todo esse conjunto de itens, serviços e produtos são entregues ali de forma gratuita e não onerosa para a prefeitura, é para o benefício dos blocos. Hoje, quando o bloco vai sair ele sabe que vai ter banheiros, segurança, uma ambulância ou um posto médico. Assim a gente foi desenvolvendo ao longo de todos esses anos essa experiência de produção. 

 Qual foi o maior desafio para implementar esse modelo?

 Não existe um grande elemento complicador. O maior desafio é conseguir os patrocinadores que sustentam toda essa estrutura. Então a gente tem conseguido educar o mercado publicitário e mostrar para as marcas que existe esse caminho de investimento, até porque a gente sabe que apenas a mídia tradicional não resolve mais os desafios de negócios das marcas. Não tem jeito: as marcas têm que vir pra vida real tocar as pessoas, e o que faltava era o mercado do Carnaval de rua, e também da avenida, vestir uma roupagem de marketing e falar a língua das marcas para que esses investimentos viessem. E eles vieram. Em 2010, os investimentos privados na organização do Carnaval carioca não passavam de R$ 2 milhões. Hoje são mais de R$ 40 milhões. E isso representa um retorno para a cidade da ordem de R$ 5,5 bilhões, segundo um estudo da FGV.

O Rio tem mais de 400 blocos oficiais e outros tantos “piratas”, como organizar esse elemento meio anárquico da brincadeira?

Os chamados “blocos-pirata” são aqueles que não querem se submeter às regras da Prefeitura e, assim, atrapalham a organização. A Prefeitura abre um período de inscrições para que possa prever o que ela vai precisar em tal dia, tal hora e em qual lugar. Se ela não tem essas informações, a rua não vai estar fechada, a ambulância e o banheiro químico não vão estar lá. E o que vai acontecer é uma manifestação espontânea e democrática sim, mas que esbarra em uma questão de conscientização dos líderes desses blocos de que nós vivemos em sociedade. Ninguém está questionando o direito a livre manifestação, expressão, está tudo certo. Mas faça isso respeitando quem não é folião, respeitando que em determinado lugar pode ter um hospital, a casa de um idoso que precisa sair para um tratamento médico qualquer e que isso não pode ser menor do que o seu direito de fazer o seu bloco ali. Um bloco muitas vezes é criado por um grupo de amigos, não tem uma estrutura jurídica formal para lidar com as exigências que as grandes empresas fazem legitimamente. A organização viabiliza mais investimentos, e por isso esse é um trabalho em constante evolução.

Em 2023 a Dream Factory foi contratada pela Liesa. Qual era o objetivo do contrato? O desfile em três dias foi uma sugestão que partiu de vocês?

 Não, a decisão sobre o Carnaval em três dias foi tomada pela Liesa. Mas, particularmente, acho que foi uma decisão acertada, porque, segundo eles, as escolas que desfilam por último – e isso é definido por sorteio – saem prejudicadas porque não conseguem ter a mesma iluminação das escolas que desfilam à noite. Uma escola que sai 5h da manhã, já com dia claro, sai prejudicada. E ao mesmo tempo, dada a demanda reprimida desse universo, criou-se a oportunidade de mais uma data de arrecadação, de vender ingressos e direitos de transmissão. E a gente tinha uma data dando sopa. Você tinha desfiles domingo e segunda, a terça era morta e na quarta era o dia da apuração. Então terça-feira virou uma oportunidade para em vez de fazer duas noites com seis escolas, fazer três com quatro. Isso comercialmente é muito inteligente porque ao você ocupar mais a comunicação, você tem mais entrega para as marcas e arrecadação de bilheteria. Também foi da Liesa a decisão de rebatizar os desfiles como Rio Carnaval.

Então qual o papel da 

Dream Factory no Rio Carnaval?

n A gente não está envolvido nem na organização nem na divulgação. Nós fomos chamados para fazer uma recriação do pacote de patrocínio do Rio Carnaval. A liga queria que a gente apresentasse o nosso olhar para um projeto que vinha havia muito tempo sem nenhuma novidade e entendia-se que precisava de algumas mudanças conceituais. E as duas primeiras foram na parte de patrocínio: centralizar a cerveja e a bilhetagem. Até 2023 a Liesa vendia o patrocínio de cerveja, e as demais empresas poderiam patrocinar os camarotes que quisessem. A partir de 2024, cerveja é o Rio Carnaval que vende, e todos os camarotes têm que seguir. Foi feita uma concorrência da qual participaram os grupos Petrópolis, Heineken e a Ambev, que saiu vencedora e assumiu um contrato de três anos. No caso dos ingressos havia ainda uma questão mais sensível, porque cada camarote é um espaço sublocado pela Liesa e o organizador vendia seus ingressos pela empresa que quisesse. Mas como o organizador de um evento pode não ter a informação de quantas pessoas estão participando? Foi então feita uma nova concorrência, vencida pela Ticketmaster. Isso traz muito mais segurança para o desfile e mais receita para as escolas.

Na sua opinião, qual é o futuro do Carnaval do Rio? 

 É até irônico falar isso hoje. Mas poucas décadas atrás a perspectiva do Carnaval era de uma época de baixa no turismo. No Rio então era só gringo indo pra Sapucaí e quem tinha dinheiro saía da cidade. Em São Paulo era a data mais baixa da operação hoteleira. Hoje, o maior desafio do Carnaval do Rio é o seu gigantismo. O Carnaval carioca é legal, bonito, diverso e coletivo. Mas a minha visão é a de melhorar gradativamente a qualidade dessa operação. Não para ser o maior, porque já é. Mas o Rio de Janeiro tem que ser o melhor Carnaval. E quando falo em melhor Carnaval estou falando para os foliões e os não foliões. A operação tem que ser o mais redonda possível para assegurar à população foliã e não foliã essa experiência inesquecível, sem violência, pontual, limpa e, principalmente, com regras sendo respeitadas.