Aydano André Motta
Dos mais apaixonantes e reparadores atos humanos, um mergulho no mar carrega o condão de varrer o estresse, apagar as angústias, iluminar a vida. Mas muita calma nessa hora: estão sempre à espreita riscos e traições, embutidos em ondas, marés, correntes. No país solar, de verão quase permanente e litoral que se estende por quase 7,5 mil quilômetros, prevenir imprudências e afogamentos requer perícia, dedicação – e presença digital.
Em tempos de redes sociais, guarda-vidas oferecem conteúdo para ajudar banhistas a evitar os perigos. Com vídeos didáticos e bem realizados, utilizam linguagem simples e objetiva para desarmar algumas armadilhas comuns das praias. Serviço de qualidade, prestado por profissionais como o sargento Henrique Bruto, do Corpo de Bombeiros fluminense.
Pernambucano, 40 anos, ele está há uma década na corporação e, há 8 anos, cuida dos banhistas em Itacoatiara, paradisíaca praia de Niterói, com apenas 700m de extensão, famosa pela potência e tamanho de suas ondas. Na sua trajetória, contabiliza ter salvado impressionantes mais de mil vidas. “Num dia comum de verão, tiramos de 20 a 60 pessoas de situações de risco”, relata, acrescentando que o recorde se deu num domingo ensolarado de 2022: 112 salvamentos.
O perfil de Bruto no Instagram (@h.bruto) é um conjunto variado de orientações, que vão muito além da convivência marinha. Ensina, por exemplo, a socorrer bebês vítimas de engasgo ou afogamento em banheiras ou baldes (ocorrências caseiras mais comuns do que se imagina). Em outro post, ele narra a jornada exaustiva de 24 de janeiro de 2022 na Praia do Sossego, também em Niterói, para alertar sobre ondas aparentemente pequenas, mas capazes de carregar banhistas – especialmente crianças – para dentro do mar. Resultado: 35 salvamentos. “A população desrespeitou minhas orientações constantemente, mas o que poderia ter sido um dia de tragédia foi evitado”, alegra-se.
Porque o perigo normalmente surge em dias de mar mais calmo – com ressaca e bandeira vermelha, quase ninguém se arrisca. “Os problemas acontecem quando as pessoas erram a avaliação sobre o mar”, ensina Bruto. “E ainda precisam ser convencidas de que é perigoso. Tem gente se acha capaz de enfrentar, mas não pode”.
Por isso mesmo, o guarda-vidas (“e não salva-vidas, porque também prevenimos acidentes, não apenas socorremos afogados”) mantém-se na plenitude da forma física, com alimentação regrada e exercícios diários, na areia e na água. “Precisamos estar em condições de correr e nadar com vigor o dia inteiro”, explica, referindo-se à jornada que se inicia às 7h e vai até o sol se pôr.
Apesar de os fins de semana e feriados de verão serem os dias de mais trabalho e tensão, foi numa quarta-feira no início do inverno que Bruto viveu a maior experiência de herói. Durante ressaca radical em Itacoatiara, a alagoana Mariana Cavalcante Gomes Ribeiro subiu na Pedra do Pampo, praticamente dentro d’água, para fotografar o impressionante mar em fúria.
Acabou arrastada e o afogamento parecia certo, quando o guarda-vidas pulou no seu encalço, iniciando batalha intensa contra as ondas inclementes, em meio às pedras e com ouriços açoitando seu corpo. “Não tinha visibilidade, fui na intuição e pediu a Deus para me guiar até ela”, recorda o guarda-vidas. “Toda minha preparação foi posta à prova. Misturou treinamento, fé e coragem”.
Quando enfim se aproximou, Mariana estava praticamente inconsciente. Com a ajuda do helicóptero do Corpo de Bombeiros, Bruto e seu parceiro, soldado Bruno, após muita luta, conseguiram tirá-la da água. O salvamento viralizou na mídia e o guarda-vidas recebeu promoção a sargento, pelo ato de bravura. “Sou religioso porque no meu trabalho vejo muitos milagres. Esse foi um”, define ele, campeão de life saving, esporte baseado em salvamentos.
Ele alerta que a maior parte do litoral brasileiro, de relevo acidentado, é formada por praias de tombo, fundas, com correntes e buracos, como Itacoatiara. Assim, a prevenção ensinada por profissionais como ele faz a diferença entre o prazer do banho de mar e o risco de vida que os oceanos escondem.
SEIS DICAS PRECIOSAS DO GUARDA-VIDAS BRUTO
1. Observe a praia. Olhe as sinalizações, e memorize a localização dos guarda-vidas
2. Com crianças, na água, esteja no máximo a um braço de distância. Na areia, sinalize o pequeno, com pulseira ou colar com telefone de contato, ou sunga com QR code.
3. Todo cuidado com costões rochosos. Se a pedra for banhada pelo mar e tiver onda, não suba. Priorize as áreas mais claras, amareladas. Nas pretas, tem limo, que escorrega e pode ocasionar quedas na água.
4. Identificar o tipo de praia. Se for de tombo (funda), pode deve haver correntes. Nas praias rasas, não se deve correr e pular, porque pode bater a cabeça
5. Se beber, não mergulhe. Mar e drogas, legais ou ilegais, não combinam.
6. Nunca entre no mar para ajudar alguém sem uma boia ou prancha. Você corre risco de virar vítima também.








