Jan Theophilo
Já se fez muita coisa com a imagem do Cristo Redentor ao longo de seus mais de 90 anos de história. Muitas bem bacanas, outras de gosto duvidoso, e algumas até proibidas (“rogai por nós”). Mas pela primeira vez o santuário foi palco de um evento tradicionalmente associado à sofisticação e estilo: mais do que um desfile de moda, uma declaração de amor ao Rio reunindo modernidade e consciência social. Com direção inspirada da estilista Alessa Migani, o desfile marcou o lançamento do Rio Fashion Show, uma celebração da identidade carioca e da solidariedade em um dos cenários mais emblemáticos do Brasil e do mundo. “Agora o próximo passo é Paris, onde faremos o Rio Fashion Show durante o Ano Cultural Brasil-França, a partir de setembro”, antecipa Alessa.
Sob a luz de uma enorme lua cheia, um frio de rachar e com o Cristo todo iluminado em tons de rosa, participaram do desfile nomes como Veluma, Magda Cotrofe, a eterna garota de Ipanema Helô Pinheiro, Milton Cunha, entre muitos outros – até o padre João Damasceno, sacerdote auxiliar do Santuário. “Todos foram escolhidos por serem “cariocaholics”, ou seja, pessoas apaixonadas pelo Rio”, contou Alessa. Na passarela erguida sobre a escadaria aos pés da estátua, eles apresentaram looks inspirados na iconografia do Redentor, com silhuetas fluidas, tecidos bordados, cores etéreas e materiais sustentáveis. No fim do desfile, o padre Omar concedeu aos presentes a Benção de São Valentino, santo cristão que é associado ao Dia dos Namorados em diversos países.
Segundo o padre Omar, o evento foi uma oportunidade diferenciada de assistir a integração de arte, cultura, solidariedade e indústria criativa. “E a Alessa significa tudo isso. Ela gera essa oportunidade de encontros entre cariocas, de promoção de nossa cidade, e colocando mais do que nunca o nosso Cristo Redentor nesse cenário de integração e diálogo com a cultura brasileira”, diz ele.
Alessa, para quem não conhece, é uma das badaladas estilistas cariocas. “É uma coisa de sangue, meu tataravô foi alfaiate do Papa Leão XIII”, conta ela, que no momento já se encontra em Paris. Ela vai manter uma loja de sua grife em funcionamento durante o Ano Cultural Brasil-França e prepara um grande desfile para abalar a Notre Dame. “Será dia 30 de setembro, quando saíremos da embaixada do Brasil até a Torre Eiffel”, antecipa ela. Para quem não conhece a Cidade Luz, é uma caminhada de 20 minutinhos. A coleção também estará presente nos salões Who’s Next e Tranoï, com apoio da ApexBrasil, ABEST e Texbrasil da Abit. Em 2026, a coleção se integrará ao Carnaval e à Bienal de Arte de Veneza.
Com o objetivo de fomentar a indústria têxtil e os pequenos produtores, o Rio Fashion Show posiciona-se como um movimento de “Soft Power”, fortalecendo o Rio de Janeiro no cenário da moda nacional e internacional. As peças terão o selo de design de moda “Made in Rio” com QR Code informando sua cadeia produtiva, disponível para varejo, atacado e exportação. A coleção é uma declaração de amor ao Rio de Janeiro e ao Brasil, com estampas inspiradas no Cristo Redentor — fotos e textos aplicados em técnicas digitais e foil, cartela de cores em tons suaves e metálicos (azuis, rosas, dourados e prateados), tecidos como chiffon, cetim, tule, jersey, sarjas metalizadas e sustentáveis, além de peças bordadas à mão e plissadas.
Mais do que apenas uma agenda de desfiles, o projeto carrega um forte propósito social. Alessa esteve em Maricá para conhecer o projeto do Pólo Artesanal da cidade. Saiu dos encontros empolgada. “Nossa ideia é capacitar toda a cadeia produtiva e incentivar a indústria criativa de Maricá”, diz Alessa, que ao que tudo indica se encantou com a cidade. Nos planos de Alessa estão a criação de estampas inspiradas em Maricá. “Uma das ideias é fazer uma coleção com estampas dos vários projetos de Oscar Niemeyer que serão erguidos na cidade. Mas ainda tem muita coisa pela frente que ainda estamos alinhando”, conta ela.
“A coleção é muito artesanal, tem toda uma parte manual de bordados, estamparia, costura. Queremos fomentar e capacitar empresas de Maricá para produzir a coleção com os pedidos de Paris e peças do desfile na França. Além disso, criar um cadastro de fornecedores e da indústria criativa de Maricá para relacionamento, network e indicação no mercado. É bem semelhante a que projeto que temos com a Arquidiocese”, conta Alessa. Por meio do Programa Ser Mulher, serão realizados workshops e oficinas de capacitação em moda, design e empreendedorismo para mulheres em situação de vulnerabilidade atendidas pelo Santuário. As atividades ocorrerão no Centro de Empreendedorismo Nossa Senhora da Gratidão, da Obra Social Leste 1 – O Sol, instituição parceira do Santuário. Além disso, três looks do desfile serão leiloados, e a renda arrecadada será revertida para projetos sociais e educativos do Santuário, ampliando o impacto da iniciativa.
Em diálogo com o meio ambiente e a cultura popular, os acessórios apresentados no desfile têm também como base a ressignificação de fantasias do Carnaval 2025, promovendo a sustentabilidade carnavalesca na moda e na arte. São colares, brincos e cintos únicos, inspirados em fantasias que expressam a energia do carnaval. As peças já foram expostas no MGallery, Gozto Largo do Boticário, Palácio da Cidade e Sambódromo (Camarote Verde Rosa) e seguirão para o Museu do Samba em maio. “Eu recolhi várias fantasias do carnaval de 2025 e elas viraram acessórios dessa coleção. mas agora, quero entrar com meu repertório de carnaval no Carnaval de Maricá”, diz Alessa. Algumas dessas fantasias foram transformadas em estátuas que serão exibidas no Camarote Favela do Carnaval do ano que vem. “Já avisei a Gabriela Lopes, responsável pelo camarote, que quero muito fazer a camiseta do ano que vem”, diz Alessa. Mas até lá, muita coisa ainda vai passar debaixo das 37 pontes do Rio Sena. A bientôt, Paris!